Novas estratégias são desenhadas a partir de cobertura em tempo real das campanhas. Enfoque será o discurso dos candidatos a nível local.
Redações de diversos veículos empenham-se em aumentar estratégia para barrar conteúdos falsos (Léo Sousa/Estadão)
Para uma mega-eleição, rapidez e atenção, não deixando escapar qualquer que seja a informação falada ao vivo ou publicada durante a corrida eleitoral, prestes a começar. Mas faltam braços para quem está no front da informação, a serviço do que acontece. O que não faz ser suficiente a quantidade de pessoas no ofício. “A eleição local é a prova contundente de que falta um exército de checadores. Joga na cara do checador que ele não vai conseguir”, é o que sintetiza Cris Tardaguila, diretora do International Center Of Journalists, o ICFJ.
‘’São mais de cinco mil cidades, né? Se você pensar que cada cidade tem dois candidatos, você já eleva o número pra onze mil", elucida Tardáguila, sobre o alcance que os checadores tem que ter a partir da quantidade de notícias a serem produzidas durante a corrida eleitoral. E é justamente na dimensão estadual a de maior impacto na vida do cidadão, redobrando a interferência dos discursos dos candidatos durante o pleito eleitoral, dialogando com realidades diferentes de um país que não vê o Censo há 12 anos.
"Como você faz planeja política pública ou destina repasse de verbas com base em números de 12 anos atrás? Além de uma crise econômica, temos uma pandemia. Isso é doloroso. Como vamos fazer para apurar esses discursos e a realidade?’’, questiona a comunicadora, que iniciou projeto de fact-cheking em redação há quase dez anos, no Jornal O Globo. Na época, era Cristina quem coordenava o ‘Preto no Branco’, espaço criado dentro do veículo durante as eleições no país em 2014. De lá pra cá, a jornalista viu o surgimento de diversas iniciativas, mas desde 2018 avalia que houve interrupção na elaboração de novos grupos e iniciativas de apuração - sobretudo durante as eleições.
- A principal lacuna é e será para sempre o seu alcance. É um drama ao qual a gente vive todos os dias, e fazemos malabarismo. Como você se torna um produto que claramente te ajuda a tomar decisões, das bobas as mais importantes, em algo que as pessoas se interessem? E isso ainda é um problema, entendendo que precisamos ver a checagem como produto dentro dessa esfera da comunicação. E falta gente de todos os tipos nesse trabalho, seja TI, seja de texto ou de qualquer outra coisa dentro das coberturas. - pontua.
As barreiras no meio do caminho
Apesar das dificuldades do setor, veículos dentro e fora das redações formatam estratégias para dar prosseguimento ao trabalho de checagem. ‘’O Fato ou Fake vai checar debates dos governadores do RJ, SP, BSB, MG e PE, usando a mesma metodologia adotada desde 2018. Essas checagens têm participação de jornalistas das praças da Globo em cada estado, pois têm conhecimento maior dos governos e da realidade local’’, enfativa Felipe Grandin, coordenador da plataforma do Grupo Globo, reunindo as seis redações (g1, TV Globo, GloboNews, O Globo, Extra, CBN e Valor).
Para esse ano, o trabalho consiste em validar a ação feita pelo projeto. ‘’As verificações no campo político são feitas com o mesmo rigor e seguindo os critérios de transparência de fontes, de metodologia e de correções que as de boatos e mensagens falsas em redes sociais. A checagem de falas é feita normalmente de forma individual por um repórter e a de discurso por uma força-tarefa. Em 2020, o Fato ou Fake seguiu o mesmo modelo’’, indicando que o mesmo e com maior empenho será repetido durante as campanhas.
Gabi Coelho, representante do Estadão Verifica, espaço do jornal impresso dedicado às checagens, aponta o fortalecimento do trabalho como principal feito neste ano. ‘’O Verifica
tem se colocado cada vez mais à frente da defesa da democracia através do combate à desinformação e tudo que ela causa. A demanda do trabalho aumenta na medida em que temos cidadãos comuns e figuras políticas usando posts falsos, enganosos e fora de contexto em suas redes sociais e aplicativos de mensagem ``. Coelho aponta que para essa eleição, uma mobilização conjunta com as plataformas Facebook, Instagram, Whatsapp e TikTok tende a ampliar as possibilidades.
- Com a parceria recente do TikTok, o número de checagens só aumentou. No entanto, o que circula na plataforma também está em outras que já trabalhamos — o que contribui para identificarmos com mais rapidez onde está o problema. O impacto disso são posts excluídos ou com o alcance reduzido, fazendo com que a informação verdadeira chegue em mais pessoas.
A união que dá força
Maior alcance, atenção redobrada. Repetindo iniciativas de ‘pool’ entre diversas organizações, em 2018 nasceu o Projeto Comprova, captando jornalistas de 43 veículos de comunicação brasileiros liderados pela Abraji – Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (dentre eles, G1 e Estadão). ‘’Temos oferecido treinamento e apoio para formação de núcleos de checagem nas redações para que elas possam também checar os conteúdos sobre as demais eleições - municipais e de governo. Estamos hoje com 40 veículos, mas esse número poderá subir antes de outubro’’, acredita Sergio Ludtke, responsável pelo projeto.
Ludtke lembra que os veículos estão em estágios distintos e cada um apoiou–se em estratégias diferentes para a corrida eleitoral de 2022.’’Alguns já criaram iniciativas de checagem e verificações, outros apostaram em núcleos capacitados para fazer checagens, e deverão usar profissionais que passaram pelo Comprova como referência’’. Para ele, o manancial de ideias dos meses anteriores mostra que todos estão em alerta e dando importância às apurações. ‘’Todos têm consciência do trabalho e ampliam a colaboração como forma de produzir um melhor trabalho, aumentando a capacidade de investigação dos conteúdos enganosos’’.
Precursora de iniciativas no meio, Agência LUPA prepara novo produto a partir de time de alunos (Reprodução - Foto: Assessoria)
A reinvenção de quem começou
Referência no trabalho de checagem, a Agência LUPA chamou pra si a responsabilidade de criação de um produto inovador, fortalecendo um novo eixo dentro de sua estrutura: a educação midiática. ‘’Entendemos que, com o trabalho de educação midiática, atuamos no combate à desinformação. E é claro: temos a de longo prazo dentro das escolas, que veremos só lá na frente, e as de curto prazo. A ideia é fazermos vídeo de diferentes plataformas, seja em Youtube, TikTok, Twitter, e também em formatos diferentes’’, explica Raphael Kapa, gerente de educação da organização.
Dentro desse esquema, a Lupa foi buscar uma iniciativa a parte do reconhecido trabalho de
checagens dos debates, feitas desde o início, sempre com capilaridade maior nas mais diferentes praças e locais do país. Para isso, construiu a Mirante, que atuará como um programa de treinamento de com jovens em todas as idades, formados a partir do núcleo educacional. Serão os jovens e seus novos horizontes a encarar a não tão fácil tarefa de criar um projeto especial de apuração e checagem durante as eleições. ‘’É interessante pensar que haverá um grupo, que não é a LUPA, pensando essa estratégia’’, comenta Kapa.
Conferindo ainda mais peso, o intuito é atualizar as ferramentas de apuração, junto aos veículos aos quais a LUPA já está como parceira em matérias. ‘’Teremos e temos treinamentos voltados para as eleições que começaram, com foco desde repórteres, que estão se preparando para a cobertura, até mesmo pessoas da sociedade civil. O objetivo é conseguir despertar ainda mais e cada vez mais, para que quando algum político fale, que escute se coloque a pensar: isso é realmente verdade?’’.
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